Faina de abastecimento de aeronaves! mais de gírias navais, e vida a bordo do Minas Gerais.


...o fonoclama alertava ao navio: "...MINAS GERAIS!...(qualquer aviso no fonoclama, começava com "Minas Gerais!") faina de abastecimento de aeronaves! É proibido fumo, corte e solda, entre as cavernas (por exemplo) 72 e 122". E era isso! ninguém fumava, não se executavam atividades que pudessem causar faíscas, ou qualquer coisa que pudesse servir de fonte de ignição ao altamente volátil vapor de gasolina de aviação (AVGAS). Como saber em que caverna se estava? Bastava ler nas paredes; o número de cada uma, de todas elas, estava pintado nas anteparas (paredes) respectivas.

O 7021 sendo reabastecido diretamente sobre a plataforma de vante. Terminada a faina de abastecimento, ele segue direto para baixo.

O 7031sendo reabastecido em posição para a catapultagem. Reparem que, instintivamente, o fotógrafo mantem-se na vertical, referenciado com o horizonte, enquanto o navio se inclina para bombordo, e o avião se ressente, com o amortecedor do trem ESQ sendo comprimido. 

A estação de combustível mais próxima da ilha. Ao serem recolhidos, antes de serem baixados ao hangar, os aviões já taxiavam para as proximidades da plataforma de vante (o elevador da frente); eram abastecidos, e rebocados para cima do elevador, e baixados ao hangar. A Marinha do Brasil não deixava aviões estacionados (espotados) no convés de voo. Reparem nas marcações coloridas sobre o convés de voo: laranja identifica a estação de abastecimento de AVGAS, e azul, o querosene de aviação (QAV), para os helicópteros. As tubulações respectivas, no interior do navio, mantinham as cores. Eu fiz esta foto entre SET/AGO89.

O leitor mais atento poderá perguntar-se, contudo: o que é uma "caverna"? Bom, pode-se recorrer àquela imagem clássica da construção do casco de um barco, onde aparecem aquele monte de estruturas verticais, curvas e transversais à quilha, como se fossem costelas. São elas que sustentarão o costado da embarcação. Pois é, uma "caverna", é o espaço entre uma costela e outra. Pois, entre as "cavernas 72 e 122", durante a faina de abastecimento de aeronaves, as coisas permaneciam daquele jeito, sem fumo, sem cortes nem soldas, até que o "boca de ferro" interviesse: ..."MINAS GERAIS! Volta à faina de abastecimento de aeronaves! É permitido o fumo, corte e solda...".

Parece ser o 7033, recebendo combustível da estação mais à proa por boreste, cujos homens aparecem mourejando no ar frio das águas austrais, na foto seguinte. Esta foto eu fiz entre 03-13DEZ90.

Comparando-se esta foto, com a da primeira estação, mais acima, vê-se claramente que ela está bem mais afastada da ilha, em direção à proa do navio. Eu tirei esta foto entre 10NOV e15DEZ95, ARAEX 95. O Atlântico Sul é frio, pros lados da Argentina.
O sinal de "volta", era o sinal de que se encerraram as atividades de abastecimento, e as bombas jogaram o combustível remanescente nas tubulações, de volta pros tanques do navio. da mesma forma,  o Nitrogênio, que é um gás inerte, era forçado pelos espaços vagos do sistema, evitando qualquer chance de incêndio (sem oxigênio não há fogo). Nunca é demais lembrar (nem menos divertido) que, "volta", na gramática naval, equivale a "fim". Por exemplo, "volta ao rancho", não era para o sujeito ir almoçar de novo, significava, ao contrário, que o rancho acabava de FECHAR. De todas as formas, de volta pra AVGAS, pouca coisa é mais inflamável do que os gases da gasolina de aviação. Acredita-se que o USS Lexington perdeu-se na batalha do Mar de Coral, em 1942, devido a tubulações partidas, que permitiram o acúmulo destes gases, que acabaram explodindo, durante as tentativas de salvar o navio. Daí todo o cuidado.

Nada neste mundo é tão ruim que não possa ser piorado. Após a grande explosão, creditada a acúmulo de vapores de gasolina, causados por tubulações rompidas, ficou impossível continuar a trabalhar no controle das avarias do USS Lexington CV-2. Ponto pros japoneses.


Estação de abastecimento na "cintura" do convés de voo, a boreste, fotografada por mim, entre 07-31ABR95. Reparem nos quadrados coloridos pintados na borda do convoo.
 
Sob o nariz do S-2T da Armada Argentina, que vem para toque e arremetida (reparem que ele não está com o gancho de pouso baixado)a estação de abastecimento a ré do espelho, por bombordo. Foto minha, de DEZ95.

Bem ao pé da foto, a estação de abastecimento a ré do reparo antiaéreo de bombordo. Um P-16 vai realizando uma decolagem livre (sem o auxílio da catapulta). Fiz esta foto entre 11-21OUT93.
Os ingleses construíram seus porta-aviões da classe Colossus, à qual pertencia o Minas, com toda a atenção a este particular. Eu acho que os registros de segurança do Minas Gerais são um baita testemunho da qualidade do navio, e da excelência do treinamento e disciplina das suas tripulações, nós do Primeiro Grupo de Aviação Embarcada incluídos. O pessoal que operava o sistema de combustíveis de aviação, pertenciam à Divisão V-5 (Victor-Cinco), do Departamento de Aviação do navio. Eles vestiam camisas vermelhas (hoje vestem roxo), e atendiam às sete estações de abastecimento que orlavam o convés, e que podiam trabalhar simultaneamente. As imagens que eu não reclamei a autoria, são de slides escaneados, sem datas, e sem informação dos fotógrafos.

Media-se o combustível com uma régua, durante o abastecimento. Com o navio balançando, a precisão ia pras "cucuias". Um dia o Oficial de Abastecimento perguntou pro Cominese (o paranaense mais grosso que já pisou este mundo de meu Deus): "Entrou quanto, 'fabiano'? O Velho J. Cominese respondeu, sempre soberano no seu mundo: "Tanto, mais ou menos tanto, em função do balanço". "Mais ou menos?!" Encrespou o oficial de Marinha "Tu tá enrolado, 'fabiano'?!"... Não, o Cominese nunca se enrolava, e não admitia menoscabos; ficou de pé na asa do P-16, e gritou com toda a boa vontade que ele tinha para com os oficiais: "Ô meu amigo! Vá toma no c#!"...

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