O Snorkel, e sobre como era difícil buscar o Tirano, escondido lá no fundo do mar...

...o hino do Primeiro Grupo de Aviação Embarcada nominava o inimigo: "Atravessa o Oceano/Buscando o Tirano/escondido no fundo do Mar..."; o nosso lema, aparecia encimando o nosso emblema: "Sic Semper Tyranis". Pois bem, o submarino era o inimigo, e o inimigo era "o Tirano", e, ao tempo do 1º GpAvEmb, este tipo de navio dividia-se em duas grandes classes, a partir do tipo de propulsão: os nucleares, e os diesel-elétricos.

Ora, os Tiranos de propulsão diesel/elétrica (na verdade, escusado o academicismo, "submersíveis", em oposição aos nucleares - verdadeiros "submarinos") precisam do ar atmosférico para movimentarem seus sistemas primários de propulsão, baseados que são, no princípio da combustão interna. Como se sabe, correndo o risco de parecer científico demais, de novo, não há fogo sem comburente, sem ar. Estes motores, além da propulsão, mantém em funcionamento os geradores, que fornecem eletricidade ao navio, ao mesmo tempo em que se ocupam do carregamento das baterias, mantendo-as prontas para as situações nas quais o navio estiver submerso. É então, quando o navio se encontra privado do contato com a atmosfera, tendo que desligar os motores diesel, que os motores elétricos se encarregam de movimentar os hélices do navio (é, digno e paciente leitor, em linguagem de Marinha, "hélice" é substantivo masculino), movimentando-o sob a superfície. Uma nota de significado histórico: o Diesel é preferido à gasolina por ser menos inflamável; lição aprendida amargamente, depois de incêndios horrorosos. O sistema em si é muito inteligente, só que restringe o tempo de submersão, à carga das baterias, sempre muito limitadas (lembra do celular?). E este tempo decrescerá exponencialmente, se o navio tiver que desenvolver velocidades mais elevadas, durante alguma emergência; e "emergências" são o material de que é feito o combate.

É exatamente por isso que os submersíveis, na verdade, passavam o maior tempo possível à superfície, ao contrário do que se possa pensar. Mergulhar? Consumir carga das baterias? só quando necessário. Ora, as vantagens de um sistema que permitisse ao submersível passar mais tempo submerso (a grande arma destes navios! A furtividade!) não eram muito evidentes até que o radar transformou a neblina, o mal tempo, e a escuridão noturna, em dia claro para quem tinha que caçá-los, visando eliminar sua ação predatória. É por isso que, mesmo que antes da Segunda Guerra Mundial já existisse o "snorkel", nenhum país entrou em combate utilizando o sistema. Seja como for, a generalização da presença de radares a bordo de navios de escolta, e aviões (principalmente os baseados em porta-aviões), aí por 1943, roubaram dos submersíveis a liberdade incondicional da navegação à superfície, obrigando à incorporação definitiva do snorkel. O radar transformou os caçadores em caça, e para eles, alguma segurança, agora, só aumentando a permanência sob as ondas. No mundo subaquático, a caçada continuava, contudo, embora de uma outra natureza, e que não está no escopo deste artigo...

A ideia do snorkel é simples como o apareto que se usa em mergulhor de recreação: um canudo que liga o motor do navio, lá embaixo, ao ar atmosférico, aqui em cima. O snorkel, na verdade, é um dispositivo que permite que o navio, mesmo submerso (embora, submerso a profundidades apenas o suficiente para iludir os radares, enquanto mantem-se em patrulha/ataque), utilize seus motores de combustão interna, evitando a utilização dos motores elétricos, e o consumo das baterias. A permanência sob a água não fica mais restrita aos limites de carga das baterias. Evidentemente que manter-se oculto sob a água, por mais tempo, é uma baita vantagem tática pros Tiranos, que ficaram virtualmente invisíveis nas inimagináveis vastidões do Mar Oceano. Acredite o leitor que, dadas aquelas vastidões (VAS-TI-DÕES!), mesmo com mar calmo, se um radar permite a detecção de um alvo tão pequeno quanto um snorkel, a, digamos, 40 Milhas Marítimas (algo menos de 80 Km), isso significa, na prática, estar virtualmente sobrevoando o submarino! aquelas coisas se movem, e há muito espaço para isto. Eles podem estar em qualquer lugar!

Um snorkel sondando acima da superfície, oferece um alvo muito, mas muito, mais difícil de ser detectado, portanto; situação que, em via de regra (Murphy é infalível!), é sempre agravada pelas condições atmosféricas, do mar, etc. Claro que o duelo tecnológico entre defesa e ataque se encarrega de combater cada avanço tático, quer dos Tiranos, quer das forças que os perseguem. Os radares continuam a se desenvolver quanto à sensibilidade, enquanto materiais absorventes/defletores de ondas eletromagnéticas aumentam as possibilidades de discrição dos submarinos. E hoje, ainda por cima, estão operacionais incríveis sistemas não nucleares, independentes do do ar atmosphérico (em inglês, AIP, que oferecem uma sedutora oportunidade de pesquisa, para o leitor eventualmente interessado)! O Tirano depende muito menos do snorkel, hoje, do que há 25 anos, quando a Embarcada foi extinta. O jogo continua muito intricado.

Todas as fotos são dos arquivos da Embarcada que eu pude preservar. Não tenho indicação do fotógrafo, da data, nem das circunstâncias das fotos. Elas dão, contudo, uma ideia da aparência de um submarino na cota snorkel. Reparem na fumaça da exaustão dos motores diesel, além da variação de altura do avião para os fins de identificação da ameaça... tempos de Primeiro Grupo de Aviação Embarcada, que atravessava o Oceano, buscando o Tirano escondido no fundo do mar...



Comentários

  1. Ah! O Tirano... até hoje difícil de detectar, veja quanto tempo levaram para achar o pobre ARA San Juan, apesar de toda a tecnologia empregada na busca.
    Foram feitos para serem furtivos MESMO.

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    1. ...o principal problema com o San Juan, foi o fto dele ter ficado fora do alcance de qualquer coisa que tivesse o poder de detectá-lo, fora as tecnologias de ultra/mega profundidade. Submarinos não vão até lá, considerando as CNTP....

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