Na aviação, não existem uns tais de "mínimos"?


Muita gente diz que voar baixo, o rasante, é a cachaça da aviação. Talvez, como seja o caso da velocidade pra quem pilota uma moto. E acredite o distinto leitor, essas coisas podem ser inebriantes mesmo. Por isso que, principalmente quando misturadas com outros fatores inebriantes, como álcool e (ou) Testosterona, tem sido causa da pavimentação de muitos atalhos pro cemitério. É preciso disciplina e supervisão constantes (pelo menos, até a maturidade começar a se impor). A preocupação com as alturas mínimas de voo, eu percebi quando, depois de chegar ao Primeiro Grupo de Aviação Embarcada, e ter acesso à toneladas de publicações militares americanas falando sobre Segurança de Voo, comecei a substituir o  entusiasmo de fã, pelo caráter de profissional da aviação. "Gerenciamento de Risco", sugeriam os investigadores, diante da análise de acidentes em que o piloto, ainda que sendo um piloto militar, deixara de ser razoável aos comandos do seu avião (os americanos estão sempre preocupados com os custos que recaem sobre os "taxpayers", ou seja, a Cidadania, que paga impostos e sustenta as forças armadas. É bonito isto).

Curvas de grande inclinação para manter o alvo dentro dos limites do alcance lateral do MAD. A cabeça detectora do equipamento, ficava na extremidade do "palito" distendido atrás do P-16, que era recolhido quando não estava em uso. Os marcadores de fumaça oferecem uma referência visual para estimar o ponto de lançamento do torpedo e, adeus "Tirano".

Slides pinçados das caixas de auxílio à instrução, retirados dos escombros do GAS, após a desativação da unidade.

Mas, não cochile o leitor, o voo militar, no que toca a preparação para o combate, ou, antecipando as condições de combate, é, inerentemente, um flerte com o desastre. No caso da missão precípua do 1º GpAvEmb, o combate Anti-Submarino (ASW, em inglês), mesmo deixando de lado as operações aéreas embarcadas em si, as exigências eram pesadas. De fato, um item importante entre a gama de equipamentos de detecção de submarinos que os nossos aviões carregavam, era o DAM, ou, Detector de Anomalias Magnéticas (MAD, em inglês). O MAD ("Méd", como nos referíamos mais corriqueiramente a ele) exigia uma separação entre o alvo (o submarino, ou, "o Tirano") e o avião, de no máximo 1000 ft (pés), ou, algo como 330 metros, para ser efetivo. Pior: seu alcance horizontal, não vai além dos 1500ft, o que obrigava as tripulações a ficarem executando curvas de alta inclinação, para não se afastarem do "Tirano", um alvo que, além de invisível, estava sempre em deslocamento e trocando de rumo.

Sobre o Pátio W, em Santa Cruz. Se eu tivesse 10 centavos, apostaria que a imagem é da chegada dos primeiros P-16E ao Brasil, em DEZ75. De um velho slide, desgarrado.

...vindo...

...indo. Celebrações da Ceia dos Cardeais de 1978. Imagens de negativos muito deteriorados, as cores estavam muito escondidas.

Agora veja o leitor: imagine que o "Tirano" do qual nos ocupamos, sabendo que está sendo caçado (Meu deus! A Embarcada chegou!" eles deviam pensar) mergulhe 900 ft sob a superfície. Claro, os submarinistas conhecem o seu ofício, eles conhecem os equipamentos lançados contra eles, e vão procurar aumentar a distância entre o seu navio e o poderoso P-16, lá em cima, tripulado por homens tão valentes e capacitados (cheios de Testoterona) como eles próprios, suando bicas, tensos de adrenalina, fumando um cigarro atrás do outro (afinal, ninguém vê o seu avião se aproximar mais e mais da água, impunemente).

Vindo...

...vindo de novo. Despedida do 7036, deixando Santa Cruz em direção ao Canadá, onde receberia motores turboélices.

Data e ocasião desconhecidos. Reparem no gancho de pouso baixado.

Ora, o resultado deste balé vertical e descendente é sempre o mesmo, o P-16 será levado cada vez mais para baixo, rasando as ondas, em busca do sinal revelador na fita do DAM, que denunciará a presença do esquivo inimigo, "escondido no fundo do mar", como reza o Hino da Embarcada. Nesta fita, interpretada pelo Operador 3, como na de um eletrocardiograma, vão sendo anotados os pontos de lançamento dos marcadores fumígenos, a altura sobre a água, a hora, a proa do avião, e o que mais pudesse ajudar na interpretação e futura avaliação daquela missão específica. Seja como for, o Manual de Voo preconizava a altura mínima de 100ft (33 metros) sobre o mar para o emprego do DAM. Mas eu só fico imaginando quais teriam sido, de fato, os mínimos mínimos, quer de dia, quer à noite, no afã de manter a reputação da unidade diante de amigos e inimigos (Meu deus! è a Embarcada aí em cima!)...

O 7032, durante a Ceia dos Cardeais de 1994. O Brig Becker, Cardeal 01, mostrando que pilotar é como andar de bicicleta: depois que aprende, não se esquece mais.
 
Fotos do Sargento Tenório, mostrando uma Barra que não existe mais.



Participações da Embarcada em paradas aeronavais. É interessante reparar que a linha de visão dos fotógrafos, considerando que o convés de voo estava a uns 11 metros da água, ajuda a avaliar a altura dos aviões em relação à superfície. Estas fotos são de pelo menos, dois eventos diferentes, embora eu não saiba as datas nem os autores.





Comentários

  1. Excelente artigo, amigo Thiesen! Ilustrado por ótimas fotos que cumpriram o papel de mostrar
    nossos "limites".

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  2. Obrigado por nos mostrar a história de uma Unidade aguerrida e de seus homens.

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    1. ...um privilégio pra mim, amigo; tão grande quanto perceber que as pessoas se interessam e gostam do que descobrem. Eu é que sou grato...

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  3. Coisa mais linda essa garça voando baixo! o ruído
    deveria ser muito bonito (e alto) !

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